Com o objetivo de ressaltar as técnicas modernas e úteis de condução defensiva de veículos automotores, instituimos esta matéria no currículo, devidamente adaptada ao uso de motocicletas e considerando a pilotagem dentro do contexto do caótico trânsito encontrado nas maiores cidades brasileiras. Embora pareça contraditório falarmos de atitudes defensivas durante a formação de batedores, lembramos aos incautos que, como veremos a seguir, a necessidade de se compreender e aplicar técnicas de defesa é diretamente proporcional aos riscos corridos durante a pilotagem. Além disso, mesmo quando pilotamos uma motocicleta policial, em emergência ou em situações normais, estamos sujeitos à acidentes, não cabendo então discutir direitos de precedência ou prioridade de passagem, pois desses acidentes poderão resultar danos materiais à motocicleta e físicos ao piloto, o que tentaremos evitar.
Os últimos dados estatísticos apontam a proporção de uma motocicleta para cada treze veículos de quatro ou mais rodas, na maioria das cidades brasileiras. Nos grandes centros urbanos, 75% usam a moto para ir ao trabalho e 38% para ir à escola. Do total, 58% são também proprietários de automóveis e apenas 8 % são mulheres.
Com o agravamento dos problemas de trânsito, que ocorreu após as últimas medidas econômicas do governo, as quais permitiram o uso de veículos particulares a um maior número de brasileiros, aliado ao aumento da poluição, dos constantes congestionamentos e do desleixo quanto ao estado de conservação dos automóveis em circulação, a motocicleta passou a representar uma das opções mais inteligentes para o transporte diário, neste final de século. Resta-nos apenas conhecer algo mais sobre as adversidades que enfrentamos ao pilotar, bem como as medidas adequadas para superá-las com sucesso, além de melhorarmos a educação dos nossos motoristas, que precisam ACEITAR e RESPEITAR mais a motocicleta no trânsito.
CONDIÇÕES ADVERSAS À PILOTAGEM
Tempo: por razões óbvias, uma motocicleta é mais vulnerável às variações climáticas do que um automóvel, como por exemplo: chuvas, neblina, cerração, enchentes, fortes ventos laterais, frio, calor, etc. Há prejuízos tanto equilíbrio da moto quanto à visibilidade, do motociclista e dos outros motoristas.
Via: buracos, ondulações, lombadas, depressões, animais (vivos ou mortos), peças ou pedaços de automóveis, areia, cacos de vidro, óleo, ou objetos sólidos encontrados na via, que representariam para um automóvel eventuais danos às rodas ou suspensões, certamente são riscos de queda para um motociclista.
Veículos: a manutenção preventiva de sua motocicleta elimina boa parte das “surpresas” que poderiam advir durante a pilotagem, mas não podemos esquecer que os outros veículos ao seu redor geralmente não se encontram em condições ideais, podendo provocar acidentes que o envolvam.
Luz: a pilotagem noturna é bastante crítica, já que a iluminação proporcionada pelas motocicletas, principalmente as de baixa cilindrada, nem sempre é a ideal, tornando-a bem menos visível pelos motoristas. Ofuscamentos por faróis contrários são mais graves para os motociclistas, por causa da viseira plástica do capacete. A presença de garupa ou cargas muito pesadas podem desfocar o farol. O fenômeno do lusco-fusco afeta a todos os condutores durante o nascer e o pôr do sol, além das entradas e saídas de túneis e serras.
Trânsito: o egoísmo, a pressa e a falta de educação encontradas no trânsito representam graves ameaças ao motociclista. As distâncias de segurança quase nunca são mantidas e o desrespeito à sinalização de advertência é uma constante, sem contar com a já citada falta de respeito à motocicleta como veículo. Os projetos, alterações e melhorias implantadas na malha viária quase nunca levam em consideração a circulação de veículos de duas rodas, os quais têm que se adaptar a elas.
Piloto: a motocicleta exige muito mais habilidade e atenção ao ser conduzida, quando comparada a um automóvel. Tanto que os melhores motoristas são também motociclistas. Isso porque, quando pilotamos uma motocicleta, nosso extinto de defesa se aguça naturalmente, pois temos que manter o equilíbrio constantemente e, ao mesmo tempo, “fugir” das ameaças que surgem de todos os lados. A maior exposição do piloto e do garupa (pela inexistência de “carroceria”) e o menor conforto de ambos (“montados” ao invés de sentados) inviabilizam o relaxamento e a distração, além de certas práticas durante a condução que, embora também desaconselháveis e atéproibidas também aos motoristas, são muitos comuns, tais como: ler, falar ao telefone, comer, fumar, assistir TV, ouvir rádio, conversar, etc. A concentração ao guidão deve ser máxima e a atenção nunca desviada por qualquer motivo.
CONDUTAS DE DEFESA
Apresentamos abaixo um rol de dicas para uma pilotagem defensiva às adversidades citadas, incluindo medidas passivas e ativas, de uma forma bem sucinta:
Vestimentas: prefira as roupas protetivas, claras e refletivas. O clima não deve ser fator determinante para seu uso, que devem ser constante. Complementos como luvas e botas são fundamentais. Nem sempre as roupas da moda são as mais adequadas para se andar de motocicleta, tendo às vezes pingentes e adornos que abanam ao vento ou enroscam na moto, podendo causar acidentes.
Capacete: 70% dos acidentes fatais envolvendo motociclistas advém de ferimentos na cabeça. Portanto, escolha um modelo que melhor se adapte a você e o utilize sempre. O capacete deve ficar justo na cabeça, mas sem prender a circulação sangüínea, prejudicar a visão, a audição ou dificultar o uso de óculos, quando for o caso. Certifique-se que o mesmo tenha o selo do Inmetro. Fique atento à validade e troque-o sempre que o mesmo sofrer uma queda, pois isso enfraquecerá sua estrutura.
Primeiros instantes: os primeiros momentos da pilotagem são os mais perigosos, pois o piloto ainda não estará totalmente “aquecido” e concentrado. A maioria dos acidentes acontecem nesse período, enquanto estamos ajustando o capacete ou testando os comandos. Até a moto ainda não estará em condições ideais. Cuidado ao sair pela manhã ou ao final de um dia de trabalho. Nas viagens, depois das paradas para descanso ou reabastecimento. Cuidados especiais quando pilotar uma determinada moto pela primeira vez.
Regras de circulação e sinalização: não confie cegamente, acreditando que outros condutores respeitarão sempre seus direitos. Se houver acidentes, certamente você levará a pior, independente de quem for o culpado. Evite “costurar” pelo trânsito e ocupe o lugar de um automóvel no centro da faixa de rolamento, a maior parte do tempo. Não execute manobras inesperadas ou sem a devida sinalização. Certifique-se que outros motoristas o vejam e permitam suas manobras.
Corredores: cuidado com pedestres incautos, portas de carros que se abrem sem aviso, outras motocicletas e braços de motoristas/passageiros, pontas de cigarro e outros objetos que geralmente são arremessados pelas janelas dos carros. Nas saídas de semáforo ou quando o trânsito está moroso, diminua a velocidade e fique atento, pois os carros podem ter parado com as rodas esterçadas e, ao partir, fecharão o corredor, espremendo a motocicleta. Em velocidade a situação piora, pois alguns motoristas desviam de buracos e obstáculos, fechando o corredor bruscamente. Procure sempre olhar por cima dos carros, antevendo o que virá à frente deles, além de prestar atenção ao comportamento dos motoristas através do vidro traseiro, pois muitas vezes eles dão “sinais” do que vão fazer. Exemplos: posição das mãos no volante, manuseando rádio (distraído), movendo o corpo lateralmente, fumando, etc.
Semáforos: nunca arranque na frente dos autos que estão ao seu lado, mas conte “mil-e-um”, “mil-e-dois” antes de sair, já que alguém na transversal poderá ter calculado mal o aproveitamento do “amarelo”, além de não prever a pouca inércia da motocicleta. Pelo mesmo motivo, ao se aproximar de um semáforo que acaba de abrir, não passe embalado, sem antes se certificar de que retardatários não estejam ainda cruzando sua trajetória.
Distância de seguimento: no trânsito urbano deverá ser compatível com a velocidade. Lembre-se de que uma pessoa normal, ao perceber um perigo qualquer à frente, levará ¾ de segundo para reagir e COMEÇAR a acionar os freios, o que a 80 Km/h representa 20 metros percorridos. Nas rodovias, fixe um ponto qualquer no acostamento e conte “mil-e-um”, “mil-e-dois” a partir da passagem da traseira do veículo que vai à sua frente e até a chegada de sua roda dianteira àquele mesmo ponto. Assim, você estará a uma distância segura, que lhe permitirá reagir a tempo de evitar uma colisão traseira, qualquer que seja a velocidade desenvolvida.
Pontos de ônibus: geralmente os coletivos não escostam totalmente à direita nas paradas e os passageiros para embarcarem e desembarcarem são obrigados a transitar sobre a pista, pela frente e pela traseira do coletivo, quase sempre sem preocupação com as motocicletas, que “cabem” no corredor formado entre a calçada e o ônibus. Nessas condições não o ultrapasse.
Cruzamentos: onde ocorrem 80% dos acidentes com motocicletas, por causa da menor visibilidade e da “lei do mais forte”, já que os motoristas sempre alegam que “não viram” ou “não quiseram dar passagem à moto”. É também um dos tipos de acidente de maior gravidade. Procure sinalizar com antecedência suas manobras e olhar em todas as direções, não interceptando a trajetória provável de outros veículos.
Conversões: cuidado com outros veículos ultrapassando-o, bem como com pedestres que invadem a pista, mesmo diante da aproximação da moto. Uma última e rápida olhada por sobre os ombros é bem-vinda antes de se iniciar uma conversão ou mudança de faixa, para checar os “pontos-mortos” de visão. Sinalize com antecedência.
Ângulos mortos: tanto para motociclistas, quanto para motoristas, devem ser combatidos, evitando posicionar-se ao lado de outros veículos, próximo às rodas traseiras. Veja e seja visto. Cuidado especial com veículos pesados e grandes ou carregados: seus ângulos-mortos são mais acentuados.
Ultrapassagens: em locais permitidos, mediante sinalização prévia nos dois sentidos, certificando-se pelo espelho retrovisor do veículo da frente que seu condutor tenha visto a moto e não pretenda fazer alguma conversão, ainda que não esteja sinalizando. Cuidado também com os veículos que vem por trás. Nunca ultrapasse pela direita pois, além de proibido, o ângulo morto é mais amplo. Ao ser ultrapassado não force, apoie à direita da faixa que estiver trafegando e diminua a velocidade. Com relação aos veículos longos ou nas vias de dupla mão de direção, calcule com cuidado a ultrapassagem, considerando inclusive as velocidades e os deslocamentos laterais de ar, que podem desequilibrar a motocicleta.
Curvas: sempre com velocidade compatível em relação ao ângulo da curva e à visibilidade. Escolha a técnica que melhor se adapte a cada tipo de curva e nunca ultrapasse nessas condições. Realizar curvas é mais difícil ao motociclista iniciante, pois as forças centrífuga, centrípeta e peso atuam com muito mais intensidade do que sobre os automóveis. Lembre-se que a inclinação da moto tem limites, que são diminuídos na mesma proporção da aderência da pista.
Chuva: redobre a atenção, diminua a velocidade, não execute manobras bruscas, nem trafegue muito próximo aos demais veículos. Reforce a sinalização. Tenha sempre à mão um abrigo impermeável, pois pilotar molhado, além de ser desconfortável, prejudica os reflexos e compromete a segurança. A situação se agrava nos primeiros instantes da chuva, principalmente após longa estiagem, já que a água “levanta” a areia e o óleo depositados no asfalto, reduzindo drasticamente a aderência. Aguarde alguns minutos até a lavagem da pista e volte a pilotar com cautela. Procure transitar pelos locais onde passam os carros, evitando as bordas da pista, aproveitando os sulcos abertos pelos pneus dos outros veículos. Evite poças ou manchas coloridas e brilhantes.
Visão: é responsável por 90% das informações que você precisa ao pilotar. Cuide bem dos olhos e não reduza seu campo visual com óculos inadequados, balaclavas (“ivanhoés”), capacetes para uso automobilístico ou folgados demais (caindo sobre os olhos), viseiras riscadas, fumês, etc. Não mantenha os olhos fixos num só ponto por muito tempo e procure ampliar sua visão lateral. Evite o ofuscamento, à noite, desviando o olhar de faróis contrários e pontos de luminosidade mais intensa, fixando os olhos na linha divisória de faixa de rolamento ou acostamento (linha de bordo) à sua direita. Reforce sua sinalização sempre que as condições de luminosidade forem precárias e pilote em velocidade compatível com seu grau de percepção das coisas, que varia de pessoa para pessoa, conforme a acuidade visual de cada um.
Efeito túnel: a visão humana sofre restrições diante do aumento da velocidade. A 40 Km/h você enxergará até 100º (para os lados), enquanto que a 100 Km/h seu campo visual ficará restrito à 40º. Imagine como ficará seu campo visual a cerca de 200 Km/h. Este fenômeno deve portanto ser conhecido antes de se acelerar totalmente uma motocicleta, educando-se para andar a altas velocidades, lembrando sempre de tentar ampliar seu ângulo de visibilidade.
Farol: sempre aceso, mesmo durante os dias mais claros. Assim, você e sua moto ficarão quase 100% mais visíveis e é por isso que em alguns Países de primeiro mundo (Japão, EUA, etc) as motocicletas não dispõem de interruptor para o apagamento das luzes.
Check-up: semanalmente faça uma manutenção preventiva mais completa em sua motocicleta, verificando os itens principais de segurança. Diariamente, antes de sair, verifique se não há vazamentos na moto, se os freios funcionam e se há combustível suficiente no tanque. Ajuste os retrovisores e aqueça o motor antes de partir.
Animais: cachorros geralmente não gostam de motocicletas e costumam correr ao lado delas, tentando morder as pernas dos seus ocupantes. Nessa hora, mantenha a calma e aumente a velocidade se for possível, lembrando que o equilíbrio será dificultado ao levantarmos as pernas e que uma queda só pioraria a situação. Na estrada, esse risco aumenta e o porte dos animais também, agravados pela maior velocidade desenvolvida. Nesses casos reduza a velocidade o máximo que puder e tente desviar, sem acionar a buzina.
Ânimo: evite pilotar com sono, quando muito cansado, após ingerir bebida alcoólica, fazer uso de medicamentos ou drogas, ou quando muito deprimido, nervoso ou excitado. Cuide da saúde e de sua postura, que são fundamentais à segurança. Combata o excesso de confiança e o exibicionismo, evitando ultrapassar os limites da máquina ou os seus próprios.
Pressa: a motocicleta já é infinitamente mais ágil e rápida do que o automóvel, o que descarta a necessidade de se correr riscos e desrespeitar as regras de trânsito, ultrapassando semáforos fechados, trafegando sobre calçadas ou na contra-mão de direção, etc, pois já ficou provado que tais práticas geram ganhos de tempo insignificantes, que não justificam o perigo, o desgaste prematuro de componentes e o aumento no consumo de combustível.
Viagens: revise a motocicleta e estude o roteiro antecipadamente. Leve mapas, ferramentas básicas e peças de reposição. Se possível evite viajar sozinho ou durante a noite.
Atenção: deve ser ampla e constante, desenvolvendo o princípio do “reconhecimento-decisão-e-reação”, que significa nunca pilotar alheio ao trânsito (distraído), mas reconhecendo o tempo todo os perigos ocultos nele, raciocinando e decidindo previamente o que faria para evitá-los, possibilitando uma reação imediata, caso alguns deles cheguem a ameaçá-lo.
Quedas: se, apesar de todos esses cuidados, você se envolver em um acidente motociclistico que resulte numa queda, não se segure na moto até o último instante. Procure projetar-se no sentido oposto à provável trajetória dos veículos acidentados. Muitas vezes, na tentativa de evitar um acidente inevitável ou minimizar danos materiais em sua motocicleta, você acabará sofrendo lesões físicas mais graves. Na queda, permita o rolamento do corpo sobre a via naturalmente, sem tentar-se “escorar” em nada, nem segurar-se. Vire a cabeça para um dos lados, tocando o queixo no ombro e tente “embutir” os membros, evitando fraturas nos braços e nas pernas. Não mantenha o corpo rígido demais, lembrando as técnicas de judô, ou tombos de crianças e bêbados que, justamente por não tentarem reagir, dificilmente se machucam com maior gravidade.